terça-feira, 16 de novembro de 2010

Na senda do Discípulo

A senda do discípulo, como vem sendo referido ao longo dos tempos em toda a tradição esotérica que vem desde Blavatsky, sempre foi um trilho estreito. Um trilho de muitas provações em que esse mesmo discípulo era testado na sua fé, entrega e aspiração, até se encontrar com o Mestre e a este se integrar. A estadia no deserto não é apenas uma metáfora bíblica, onde Jesus foi tentado nos seus próprios desejos até se limpar de todos eles e assumir a tarefa que lhe correspondia, mas uma realidade interna em todos nós. Estar nesse deserto é estar na solidão de uma dor ancestral que transportamos de muitas encarnações e que precisa ser curada. Mas este é um processo solitário, por mais que sejamos acompanhados de outros planos.

Não é certamente fácil para o discípulo, aquele que aspira a ser um servidor do plano evolutivo, confrontar-se com os relatos de abundantes e luxuriantes oásis de Paz, quando à sua volta apenas as areias quentes do deserto, a secura da paisagem e o desconforto de uma caminhada sem aparente rumo se apresenta. É certamente mais fácil pegar nesses relatos e enterrá-los na areia, pelo insulto que estes lhe parecem lançar.

Mas essa é a nossa prova. Saber acreditar que pela persistência dos nossos passos, por mais que estes se enterrem nessas areias quentes, os tais oásis se apresentarão diante de nós, é a chave para que possamos transformar toda essa carga ancestral que transportamos.

Que olhemos para nós próprios com compaixão e percebamos o quanto já foi transformado. Será que somos hoje os mesmos de há um, dois, cinco anos atrás? Apesar de todas as dificuldades, e devido a essas mesmas dificuldades, quantas não foram as transformações? Existe hoje uma maturidade que não tínhamos, e uma consciência da realidade bem mais ampla, apesar de tudo.

Quando entrámos nesse deserto íamos cheios de expectativas. Diziam-nos que do outro lado encontraríamos a PAZ. E então, na empolgação que isso nos trouxe, lá carregámos a mochila e preparámos as inúmeras refeições para a travessia, as várias vasilhas de água, e mais aquele livro, e mais uma bússola para não nos perdermos, e mais isto e aquilo. Fomos para lá carregados com toda a tralha civilizacional.

É claro que à medida que caminhávamos tudo isso foi pesando. Líamos o livro que falava de PAZ, mas os nossos pés pelavam com o calor da areia, sangrando. E isso ia-nos deixando confusos com tudo aquilo. Seria uma ilusão? Teríamos sido enganados por aqueles que diziam que do outro lado do deserto estava a PAZ?

Pelo trajecto fomo-nos esquecendo de todas essas coisas. Não era mais importante a busca do oásis mas procurar algum conforto nessa caminhada, vivendo aquele momento específico e não o que o horizonte nos reservava. E então numa dessas noites frias, pegamos no livro que falava de Paz e rasgamos as suas páginas para acender uma fogueira que nos aquecesse, e nunca aquele livro tinha servido tão bem. Foi certamente uma das melhores noites no deserto pelo conforto das chamas. E assim fomo-nos despindo dessa tralha. A mochila foi-se esvaziando até que nos esquecemos da caminhada em si e nos concentrámos apenas no passo seguinte a ser dado. Ficar preso na ideia desse oásis de Paz que fica lá longe é certamente um dos maiores obstáculos para que essa Paz se faça presente.

Só depois do nosso ego estar completamente despido nesse deserto é que o oásis despontará, não no horizonte - pois os oásis que aparecem nos horizontes podem muito bem ser belas miragens -, mas no centro do nosso coração.

Ali, no meio desse deserto, completamente nus, sem bagagem, sem comida, sem água, sem livros e bússolas, o oásis de Paz desponta de dentro, e dentro começa a transformar esse mesmo deserto. À nossa volta, onde até então apenas existia areia, começa a nascer vegetação, um regato de água cristalina brota do chão e rasga a paisagem; por todo o lado os lírios despertam de um longo sono. Tudo se transforma nessa PAZ em tempos procurada e depois esquecida e negada.

Nada foi encontrado.

A PAZ não se busca; é ela que nos encontra quando estivermos receptivos e prontos para a receber. Por isso não há técnicas para serem ensinadas, mas apenas a certeza profunda, inequívoca, que no fundo do nosso coração reside essa semente que aguarda o momento certo para despontar. E como toda a semente, também esta necessita que o terreno seja limpo e preparado para essa abundante colheita que nos consagrará como seres Divinos que somos.

A chave está na fé, que é essa certeza absoluta que tudo está no seu ponto de realidade exacto, e que no momento certo tudo se consumará de acordo com uma Vontade Maior.

Na entrega, o que significa colocar tudo nas mãos dessa vontade e aceitar as provações e as dificuldades com Alegria, pois é o terreno que está a ser preparado para o despontar dessa semente.

Na aspiração, que ao contrário do desejo onde se busca algo para nós, busca a doação incondicional ao Divino. Eu aspiro a uma condição, porque me dou integralmente a essa condição e não porque a desejo para mim.

E quando esse deserto se transformar num oásis, porque do nosso coração jorrou a VIDA e a PAZ, o discípulo deixará de o ser e com a sua radiação atrairá muitos outros nessa mesma caminha para uma cura profunda e libertadora. Ele é agora o outro lado do deserto para aqueles que iniciam a sua caminhada, não para que seja encontrado por estes, mas para que a estes, de forma silenciosa, impessoal e compassiva, possa doar a Paz que em si despertou para que em cada um a sua própria Paz se manifeste.
 
Não existem, por isso mesmo, técnicas ou fórmulas que se possam ensinar, mas apenas a Vontade de que assim seja, porque assim É.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

O Silêncio

O silêncio é a nota profunda e imaculada do nosso estado original. É a Voz da eternidade debruçada sobre o tempo; um doce murmúrio que Deus sussurra em nosso ouvido. É uma suave fragrância da Alma que preenche o vazio onde tudo se manifesta. Um aroma sagrado que abre nos nossos corações o espaço necessário para que possamos ouvir a Voz da Eternidade... aquela que nos fala do Verdadeiro Ser que somos e da Morada que nunca deixámos.

Cultivar o silêncio é procurar em nós o rosto de Deus, essa expressão de Fogo que somos nós verdadeiramente. Ali, todas as forças que controlam os planos tridimensionais são suspensas, despertando um estado de quietude profunda onde nada de irreal pode penetrar. Nesse Templo Vivo de Luz Pura em que nos transformamos, nada mais permanecerá que a realidade dos planos supra-civilizacionais. O silêncio é a antecâmara do contacto com o Divino em nós, com a verdade para além de todas as ilusões.

Estar em silêncio, no entanto, é muito mais que a ausência de palavras: é um estado de consciência que se manifesta em cada gesto, em cada atitude e em cada momento da nossa existência temporal. Que possamos compreender, pois, que a palavra, ou a ausência desta, nada tem a ver com o silêncio. Nós podemos falar e ao mesmo tempo estar em silêncio, e isso acontecerá sempre que as palavras não rasgarem o éter circundante, mas se, pelo contrário, ondularem com esse éter na harmonia resultante da sonoridade límpida, reflexo de um estado de Paz Profunda, com que são emitidas. Falar em silêncio é, sem dúvida, uma das maiores dádivas que poderemos ofertar ao planeta tal o ruído produzido por esta civilização.

Contudo, esse silêncio não é para ser manifestado, apenas, na esfericidade das palavras, mas também na doçura dos nossos gestos, na qualidade dos nossos pensamentos, na consciência de serviço das nossas acções, revestindo tudo com a PAZ resultante da entrega incondicional à Vida.

Estar em silêncio é, por isso mesmo, estar em sintonia profunda com os núcleos internos do nosso Ser. É emitir para o exterior uma nota esférica e cristalina, onde nenhuma aresta se encontra presente. Um Ser em silêncio é um Templo Vivo; uma expressão do rosto de Deus dentro da matéria em ascensão.

Cultivar o silêncio é, desse modo, o primeiro passo para a revelação, na substância tridimensional, do Fogo Cósmico do Espírito. Ele é, em definitivo, a Voz da Eterna Presença.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Deixar Fluir


Em muitos seres existe hoje uma urgência, uma necessidade existencial de corrigir o mundo, de sarar as feridas de uma civilização esquecida de si mesma, distante dos propósitos maiores que a ela estavam destinados. Uma urgência que se torna cada vez mais presente em todos aqueles que assumiram um compromisso para com a humanidade. O compromisso de caminhar de coração aberto diante do olhar cego daqueles que só acreditam naquilo em que podem tocar, mostrando que esse tocar é mais profundo, mais vasto; que tocar com o coração é sentir a unidade de todas as coisas na força transmutadora dessa energia maior a que chamamos AMOR.

Mas essa urgência deixa-nos inquietos, confusos quanto ao caminho a percorrer. Como poderemos ter a certeza de que caminhamos pelos trilhos do nosso destino? Que todas as experiências vividas nos conduzirão ao momento certo, à tarefa exacta, ao lugar que nos corresponde num Plano Maior do qual somos um elemento essencial? A resposta é simples e resume-se, tal como se de um mantra se tratasse, na seguinte frase: "Deixar Fluir". O efeito destas palavras deveria ser mágico para todos nós, trazendo, com o simples acto de as pronunciar, a PAZ.

Se hoje estamos no lugar onde nos percebemos, se por caminhos misteriosos nos foi dado encontrar pessoas importantes para o nosso processo tridimensional, viver situações inesperadas e regeneradoras de energias estagnadas em nós, é porque foi esse mesmo fluir que nos levou até lá. Nenhum estratagema mental, nenhum plano por mais elaborado que seja, nos levará ao destino que nos compete cumprir, pois, se assim fosse, essa condução estaria nas mãos da personalidade e não da Alma.

A personalidade é como uma pessoa perdida dentro de um labirinto que ela julga conhecer ao pormenor e onde, para seu próprio desespero, se disso tiver consciência, repete constantemente os mesmos erros, passando pelos mesmos lugares, tropeçando nos mesmos obstáculos, batendo infindáveis vezes com a cabeça nos mesmos becos sem saída, numa encenação dolorosamente repetida na ilusão de quem julga saber por onde caminha. Pois não sabe! Quando mais a personalidade procura, mais perdida fica nesse emaranhar de corredores. Apenas quando ela parar de procurar e entregar essa condução à Alma que, por cima do labirinto, vê todos os caminhos, é que, finalmente, num doce fluir de quem é conduzido por mãos mais sábias, ela encontrará o trilho do seu destino.

Não foi esse fluir sem aparente rumo que, tal como folha sobre as águas de um rio, nos conduziu ao lugar onde nos encontramos? Não deveríamos, uma vez mais, confiar nessas mãos sábias que sabem exactamente a tarefa que nos está destinada cumprir; o espaço e o tempo certo de uma vivência contínua no olhar de quem antes mesmo de encarnar tudo pôde testemunhar de um caminho por si predestinado e escolhido? Porquê a ansiedade, então? Porquê a dúvida e a incerteza que tantas vezes se instalam? Não caminhamos pelo trilho de uma existência dedicada a Deus, de uma missão de quem se propôs ajudar a humanidade nestes tempos difíceis? Se tudo entregarmos ao Alto, o que recear? Não somos todos nós auto-convocados numa tarefa que assumimos diante dos nossos Irmãos Maiores, propondo-nos ajudar na elevação daqueles que compartilham este planeta connosco? Repitam, pois, comigo, esta simples frase: "Deixar Fluir". Deixar que a corrente desse imenso rio nos conduza à enseada do destino que nos compete cumprir, sem desejar alcançar nenhuma das margens, pois, se o fizermos, a estas ficaremos presos; estagnados nos charcos pantanosos de onde dificilmente sairemos.

"Deixar Fluir" não é inércia, mas prontidão. E não é inércia porque sabemos que uma mão maior nos conduz. "Deixar Fluir" é como um bombeiro no quartel, pronto a correr a qualquer eventualidade se a sirene tocar mas que, enquanto espera, simplesmente deixa que o tempo corra docemente, na tranquilidade de quem sabe que está ao serviço de uma causa maior. Se assim não fosse, e ele deixasse o quartel por não ter suportado o silêncio e a espera, seguindo outros caminhos, a sirene tocaria e ele não estaria pronto para actuar. Mas se ficar no quartel, mesmo sem saber da tarefa que lhe corresponde desempenhar, quando a sirene tocar ele estará pronto e tudo largará para cumprir o seu destino, pois sabe que essa é a sua única função.

Enquanto espera, no entanto, as suas únicas palavras são: "Deixar Fluir". E este é o caminho directo para a PAZ.

A verdadeira razão de ser de uma semente


Certa vez um forasteiro ao passar por uma estalagem, entrou e sentou-se numa das mesas. Uma jovem que ali servia aproximou-se, cumprimentando-o enquanto lhe entregava o menu. Este pediu uma refeição ligeira que a jovem anotou.

Depois de ter comido, o forasteiro reparou que não trazia consigo dinheiro, pedindo à jovem que chamasse o estalajadeiro. Quando este se aproximou, disse-lhe:

«Não trago comigo dinheiro com que possa pagar esta refeição, mas se aceitardes poderei oferecer-vos estas duas sementes que contêm em si a Verdade Suprema e que me foram entregues directamente por Deus».

O estalajadeiro, honrado com tal oferta, aceitou.

Antes de sair, o forasteiro chamou a jovem que o tinha atendido de forma simpática e acolhedora, oferecendo-lhe, sem que ninguém o soubesse, a terceira semente que trazia consigo.

O estalajadeiro pegou então nas duas sementes e colocou uma dentro de um cofre e a outra no pedestal do templo para que a população pudesse louvar a Verdade Maior.

A terceira semente, aquela que o forasteiro dera à jovem que servia na estalagem, foi lançada à terra e regada com o amor que essa jovem dedicou a tal tarefa. E enquanto as pessoas se reuniam no templo para louvar a semente da Verdade Maior, e o grupo mais restrito se reunia secretamente para adorar a semente guardada no cofre, a jovem limitava-se a caminhar até ao quintal onde, todos os dias, ia regar a pequena semente.

E os anos passaram...

O culto à semente do templo cresceu e espalhou-se pela região. Muitas eram as pessoas, multidões imensas, que todos os anos caminhavam até ao templo para fazerem as suas preces e os seus pedidos. 

O outro culto, o da semente guardada no cofre, mais reservado, secreto e misterioso, crescia também, trazendo até ao núcleo central, depois de provas de admissão e rituais vários, algumas pessoas da região.

E enquanto os dois cultos cresciam, a jovem que trabalhava na estalagem passava parte do seu tempo a cuidar da semente que, entretanto, se transformara numa bonita árvore.

E foi então que um grande burburinho se levantou naquela aldeia quando foi anunciada a chegada de um enviado de Deus. Ele, o mesmo homem que anos antes entregara as sementes, entrou na estalagem e sentou-se numa das mesas.

O estalajadeiro, honrado com tal visita, dispensou todos os empregados para que fosse ele o único a servir aquele homem. Foi então que este, ao recusar o menu, disse:

«Servi-me a Verdade».

O estalajadeiro foi então buscar as duas sementes, trazendo-as até si:

«Aqui está a Verdade, Senhor».

O forasteiro olhou para ele confuso, dizendo:

«O que me serves, homem? Achais mesmo que posso comer estas sementes

Ao que o estalajadeiro respondeu:

«Mas, Senhor, não me haveis pedido para vos servir a Verdade? Ela aqui está: as sementes que me haveis oferecido

O homem levantou-se desapontado, dizendo, enquanto saía:

«Quando eu vos ofereci essas sementes elas eram a verdade, mas hoje a verdade é outra

E saiu da estalagem com fome, caminhando pela rua principal da aldeia.

Foi então que, ao passar pelo quintal de uma casa mais afastada, ele viu uma árvore robusta e, junto desta, uma jovem. Aproximou-se.

«Que árvore bonita...», disse ele num leve sorriso.

«Sim, mestre!», respondeu a jovem, reconhecendo-o. «Nasceu da semente que me haveis oferecido.».

Ela aproximou-se então da árvore colhendo alguns frutos que lhe ofereceu, dizendo:

«Aqui está a Verdade que procurais».

Ele sorriu, retorquindo:

«Agora que haveis compreendido, não guardeis esses frutos num cofre para os proteger, nem os coloqueis num pedestal para os adorar, mas doai-os ao mundo para que, no mundo, uma nova verdade possa nascer.»

E aquele enviado de Deus partiu satisfeito, pois pelo menos uma pessoa tinha compreendido a razão da sua missão, e assim sendo, novos frutos, germinados de uma árvore nascida das mãos sábias de quem soube compreender a verdadeira razão de ser uma semente, iriam ser doados ao mundo, saciando-o de uma longa fome.

Uma Reflexão para os Tempos de Hoje


Estes são tempos de largar os alforges, as espadas e as armaduras que usamos para nos protegermos daquilo que não conhecemos; são tempos para marchar sobre a orientação sábia de uma presença interna que tudo sabe dos caminhos que temos que seguir mas que continuamos a ignorar, tantas vezes, por termos medo de ousar dar o passo certo.

Estes são tempos para caminharmos nus e de mãos abertas, certos que uma Luz Maior nos vestirá e a Energia do puro Amor nos alimentará. São tempos para que todas as âncoras sejam levantadas, mesmo vivendo dentro da civilização, o que significa ficar desapegado de tudo: equidistante do Sim e do Não, e assim cumprir o plano que os Mestres, aos quais estamos coligados por Afinidade Interna, necessitam materializar para que esta humanidade se cumpra e este nosso mundo possa despertar para o Cosmos que o aguarda desde sempre.

Nós somos os operários dessa tarefa, coligados a empreiteiros que cumprem os planos arquitectados por Conselhos Maiores. Mas um operário não pode fazer o que acha melhor, senão a obra não se realiza. Há que saber seguir o projecto estabelecido e há muito delineado para que, de uma forma harmoniosa, tudo seja cumprido e implementado.

Se nesse operário ainda existir a vontade do Ego como motor da sua vida tridimensional, julgando ele saber qual a melhor forma de cumprir a tarefa, o empreiteiro simplesmente não o contratará. Para este apenas interessam, na implementação desse projecto, seres que já estejam em silêncio profundo e que sejam capazes de cumprir a tarefa que lhes for atribuída de um modo estável e correcto.

Apenas quando a personalidade não condicionar mais os passos que temos que dar e uma força maior, de Natureza Interna, começar a manifestar-se de forma permanente, é que estaremos em condições de servir no grupo ao qual estamos coligados. Só então, e nunca antes, é que nos tornaremos um prolongamento desses Mestres, um instrumento nas mãos do Pai que, em essência, somos todos nós dentro da ilusão do tempo.

Este processo de filiação aos Mestres é gradual. Ele começa com a aspiração ao Divino. Uma aspiração cristalina e incondicional, compreenda-se, e não uma aspiração intermitente. Esta aspiração terá que estar presente em cada batida do nosso coração, em cada lufada de ar inalado pelos nossos pulmões. Terá que ser uma aspiração sólida, contínua, presente em cada gesto, em cada sorriso, em cada lágrima, em cada momento de alegria ou de dor... e este é o primeiro passo.

O segundo passo tem por base o discernimento. O discernimento para perceber tudo aquilo que não é, tudo aquilo que nos afasta do caminho da nossa meta Interior, impedindo-nos de cumprir o que, em consciência, já temos como a única coisa realmente importante. Esta é a fase da longa travessia do deserto onde o fardo civilizacional terá que sair dos nossos ombros para que uma leveza misteriosa, uma tranquilidade doce se instale na segurança de quem, mesmo tentado pelo “diabo”, como nos é relatado na bíblia, tudo rejeitou que fosse contrário ao caminho por nós determinado, chegando ao fim do deserto imune e livre das tentações que a civilização ainda alimenta em todos nós. 

O terceiro passo é o da entrega. O momento em que nos abriremos de uma forma incondicional ao Divino e a nossa Vontade e a de Deus passarem a ser uma só. E então, com a personalidade alinhada e entregue nos braços ternos da Mãe Divina, estaremos finalmente prontos para cumprir a parte do Plano que nos compete manifestar e de responder de forma estável aos estímulos dos Mestres.

Hoje são muitos os seres que já estão nessa terceira fase, prestes a receber a Graça final que consagrará os seus corpos. Depois de uma longa travessia do deserto, onde tiveram que ficar completamente nus perante o olhar de Deus, começam agora o processo final de entregar a sua própria existência, deixando que uma força transcendente e oculta os conduza nas tarefas a desempenhar.

No entanto, essa terceira fase ainda não está completa. Ainda não entregámos tudo; ainda resistimos em largar coisas que temos como importantes, em particular as muletas que nos ajudaram nas fases anteriores e que agora são completamente inadequadas para o caminho que se abre diante de nós. Essas muletas assumem, geralmente, a forma de conhecimentos que foram acumulados ao longo dos anos; de sistemas filosóficos ou doutrinais, mais ou menos esotéricos, que nos ajudaram a esculpir a nossa personalidade, mas que agora têm que ser postos de parte como sinal da nossa entrega.

É importante compreender que um Mestre Espiritual não tem religião, não professa nenhuma doutrina, não segue, não defende, nem estabelece nenhuma corrente esotérica específica, já que a sua única filiação é com Deus, sem máscaras, adornos ou formalismos que possam condicionar esse processo. Tudo é cristalino e puro. Se queremos estar ao serviço desses Mestres temos que largar todos esses registos antigos, mesmo os mais esotéricos, pois tudo isso pertence ao mundo e nós estamos em processo de estar no mundo sem ser do mundo.

Outra das muletas que temos que deixar é a dependência para com aqueles que nos ajudaram no nosso processo espiritual, em fases anteriores. Esses seres, sejam eles gurus, líderes espirituais ou mestres encarnados, foram importantes durante uma parte do percurso, mas agora não nos podem ajudar mais. Na terceira fase, o processo é procurar em nós a essência profunda daquilo que somos. Temos, por isso mesmo, que nos desapegar do mestre exterior para que possamos fazer contacto com o Mestre Interior que somos nós próprios nas dimensões mais altas.

Enquanto estivermos apegados ao mestre exterior, dependentes das palavras e da presença desse mestre para que algo aconteça, as portas do Mestre Interior ficarão fechadas. Temos que deixar, por isso mesmo, de ter uma atitude passiva diante do processo, vivendo na sombra desse mestre, para que possamos ter uma atitude activa, de modo a que nos tornemos nesse mesmo mestre: aquele que nos irá conduzir ao interior do templo. Que possamos compreender que o papel do mestre exterior foi apenas o de nos conduzir até à entrada do templo. Apenas o mestre interior, essa Voz Profunda que aguarda ser reconhecida por nós, nos levará até junto do sacrário dentro desse templo.

Temos, por isso mesmo, que aprender a caminhar pelos nossos pés e não pelos pés do mestre. O caminho é buscar em nós uma verdade Interna, já que apenas esta nos conduzirá à sabedoria profunda sem a qual não há como fazer contacto com as Hierarquias Espirituais às quais estamos coligados. Não é a quantidade dos conhecimentos acumulados que nos levará lá, nem as palavras do mestre exterior, por mais sábias que estas sejam, mas a qualidade do nosso Amor e da nossa Entrega. E isto é uma LEI.

Assim que essa entrega for feita, a nossa função Interna ser-nos-á revelada e finalmente tornar-nos-emos um prolongamento dessas Hierarquias de Luz. Será através de todos nós que o Plano se cumprirá neste planeta; que as energias do Cosmos poderão, finalmente, ancorar nesta dimensão e actuar de acordo com a vontade do PAI.

Existem vários lugares, não revelados, prontos a receber todos aqueles que já se encontram plenamente estáveis dentro da aura de uma dessas Hierarquias; lugares que serão conhecidos, por contacto interno, dos seres que forem chamados a permanecer por largos períodos de tempo, ou mesmo a tempo inteiro, dentro da tela magnética desses espaços. Será por esses pontos de realidade estável, quando grupos de seres encarnados, e devidamente preparados, passarem aí a se reunir e a viver, que o Fogo Hierárquico começará a permear, através dos seus prolongamentos encarnados, a substância planetária, permitindo que a humanidade possa, ela própria, dar um salto iniciático.

Na zona do globo chamada Portugal, existem vários lugares inter-dimensionais que são o reflexo, na superfície do planeta, da batida profunda de um coração oculto. Esse coração é o chakra cardíaco do planeta que irradia Amor Cósmico e Harmonia Universal por toda a humanidade.

Quem está destinado a viver nessas zonas de contacto, já foi escolhido mesmo antes de encarnar. É tudo uma questão de tempo até que o amadurecimento dos seus corpos aconteça e o alinhamento final se concretize de modo a que possam responder de forma exacta e sem vacilações ao estímulo Hierárquico.

Enquanto esse amadurecimento não se dá, as zonas de contacto são mantidas ocultas, pois não é possível transportar para essas zonas os restos desta velha civilização. É necessário, primeiro, uma purificação global dos nossos corpos para que, quando esse momento for revelado, nada do mundo levemos connosco.

O processo, por isso mesmo, não pode ser feito precipitadamente. Não se trata de fugir do mundo, como muitos fazem, camuflando arestas ainda por limar, mas deixar o mundo de uma forma doce e suave, tal como um fruto maduro que se desprende da árvore sem que ninguém o puxe.

Se para trás deixarmos conflitos por resolver, apegos emocionais por esclarecer, é porque existe algo que está a alimentar esses apegos e esses conflitos. Então o processo não é largar tudo para ir para uma zona de contacto, mas resolver esses conflitos e clarificar esses apegos. Só quando nada mais nos condicionar é que estaremos verdadeiramente prontos para dar esse passo.
   
Fugir do mundo é relativamente fácil, ajudando a camuflar aspectos que ainda estão por trabalhar e que muitos não têm a coragem de corrigir ou mesmo de confrontar. É como alguém que, não sendo capaz de resolver os problemas de uma empresa em fase de falência, resolve abandoná-la na irresponsabilidade de quem julga que todos os problemas deixarão de existir. Pois não deixam! Atrás dele irão os cobradores e todos os empregados. O problema é que nas zonas de contacto os cobradores e os empregados não podem entrar, e com eles, também nós não entraremos.

Deixar o mundo é mais difícil, já que exige que tudo fique esclarecido, ou seja, todas as dívidas terão que ser pagas e todos os problemas clarificados, para que depois, e só então, libertos dos cobradores, possamos finalmente deixar a empresa sem que nada mais nos prenda ou condicione.

No entanto, enquanto isso não acontece, e se esse for o nosso destino, que procuremos, de uma forma estável e responsável, desempenhar tarefas dentro desta civilização, pois esse é um caminho igualmente válido e importante, já que permitirá ajudar de uma forma directa no despertar de muitos seres e, como consequência desse despertar, na activação de mais alguns núcleos de serviço Hierárquico que irão integrar a rede mundial, ajudando e possibilitando a descida, neste plano de manifestação cósmica, do Fogo Divino.